Nos últimos dias tenho ficado chocada com a capacidade de analisar
as situações de algumas pessoas. O primeiro problema é reagir pela primeira
informação ou primeira impressão. Por exemplo, quando a mídia dá uma notícia,
precisamos verificar para ver se de fato é assim. Muitas vezes, nos apresentam
apenas um lado da questão.
Observe um trecho da letra dessa música de Daniel e Samuel
(cantores cristãos):
A
boca da noite não fala nada;
A
manga da blusa não mata a fome;
Bainha
não serve pro peixe espada;
O
prato é pra comer e não come;
A asa
do avião não tem pena;
As
pernas dos óculos não usam calça;
A mão
de pilão, pra mim, nem acena;
Calçada
tem pé e vive descalça;
Tem
coisa que parece ser mas não é.
Só
Deus é até o que não parece.
Deus
se manifesta onde quiser.
Só
quem tem discernimento conhece.
Porque essa música é tão interessante? Porque quebra a
lógica de significado esperado por nós. Retira uma palavra do contexto original
e a usa em outro contexto, onde seu significado se torna diferente. A expressão
“boca da noite” é uma metáfora regional para o começo da noite. Mas a boca é um
órgão que utilizamos também para falar. A mistura de dois tipos de linguagem (metafórica
ou direta) causa uma surpresa no nosso entendimento. Isso só nos diz que
estamos prontos, preparados para compreender numa direção pré-estabelecida. E
isso pode se tornar uma armadilha para nós. Porque nem tudo se repete. Nem toda
boca fala; nem toda manga se come; nem toda espada tem bainha; etc.
Muitas vezes, essa tendência a deduzir pode ser usada
contra nós. Uma conversa pode induzir você a entender de uma forma que vai ser
prejudicial a você, à verdade, ao direito de outra pessoa, etc. Como aquela brincadeira que uma criança diz à outra: O que é, o que é: enche uma casa, mas não enche uma mão? Ele induz a pensar numa casa habitação, mas na realidade trata-se de uma casa de botões. Daí a
importância de analisar aquilo que com tanta veemência assumimos como verdade e
nos comprometemos a defender. A bíblia diz: “não é bom proceder sem refletir, e
peca quem é precipitado.” (Provérbios 19:2). Há coisas que só
discerniremos espiritualmente, está além do poder do raciocínio ou da
informação obtida, mas a reflexão já nos dá muito em relação ao discernimento. O povo
de Beréia nos ensinou essa lição. Quando Paulo chegou e lhes ensinou, eles “[...]
receberam a palavra com toda a avidez, examinando as Escrituras todos os dias
para ver se as coisas eram, de fato, assim.” (Atos 17:11). A bíblia diz
que se aprende o que é o espiritual comparando-se ao que é espiritual (1
Coríntios 2:13).
Além da má compreensão, há as más consequências. Nem tudo
deve ser dito a toda hora, em todo lugar e a qualquer pessoa. Cada coisa que
dizemos ou fazemos deve ter tempo, espaço e auditório específico. Cada coisa
que dizemos ou fazemos inclui consequências e essas consequências devem ser consideradas
quando falamos. Às vezes, a melhor resposta é o silêncio. Outras, calar é
consentir o mal. Nossa força deve ser direcionada para aqueles investimentos
que realmente valerão à pena. Naqueles em que faremos uma diferença positiva.
Por isso, o problema a evitar é reagir sem analisar os argumentos e as
consequências com cuidado. Uma outra questão é a ilusão da concordância.
O que significa concordar
Necessariamente, quem concorda é simpático ao argumento da
pessoa ou à pessoa? Você só concorda com o que/quem lhe agrada? Então, você tem
um problema com a justiça. Eu não gosto da cor azul do céu, ficaria melhor
vermelho. Então, eu não concordo que o céu é azul. Isso parece uma postura impossível,
mas não é. Eu não gosto de tal pessoa, então todas as qualidades dela
desaparecem, tudo o que disser está errado e por aí vai. Quando estabelecemos
que deve prevalecer a nossa vontade,
vantagem e gosto a vontade de Deus e os dons alheios são blindados aos nossos
olhos.
Você é capaz de concordar com uma pessoa que não gosta?
Argumentos são independentes daqueles que os usam, assim como a bandeja não tem
relação direta com o sabor da comida. Deus usou uma burra para falar com o
profeta tolo (Números 22:21-34); uma menina para orientar um comandante de
exército (Naamã, em 2 Reis 5); o diabo usou um profeta para tentar outro (1
Reis 13); um animal para tentar Eva (Gênesis 3). A mensagem independe daquele
que a transmite. Ela é discernida pelo conteúdo e direção, não pelo mensageiro.
Isso significa que o fato de você não concordar ou não colaborar
com uma pessoa em uma coisa não significa que você seja seu inimigo. Eu não
colaborarei numa tarefa ou concordarei com ninguém, por mais que eu ame, se
essa tarefa ou pessoa estiver contra a Palavra de Deus. Nem a mim mesma eu me
dou este privilégio. E se eu der sofrerei as consequências. E também o fato de
concordar ou colaborar não significa que seja amigo. Muitas pessoas possuem
diferenças em várias áreas, mas por concordarem ou ser interessante para elas uma
junção de forças temporária se permitem cooperar. Concordância não quer dizer
amizade e nem discordância inimizade.
O problema do discurso da tolerância
O problema é que se você discorda, automaticamente você se
torna inimigo. É muito mesquinha e manipuladora essa visão. Você pode concordar
e discordar em parte com/de alguém. Não é porque eu não concorde com
determinadas posturas de uma pessoa em uma área que eu estou comprometida a
diminuir seus direitos ou competências em outra área. Hitler era um homem de um
caráter terrível, um dos maiores assassinos de seu tempo, mas temos que admitir
que ele desenvolveu uma inteligência interpessoal e social muito acima da
época, senão não teria encantado e arrastado tantos cúmplices convictos. Mas eu
reconhecer a inteligência de Hitler não me torna simpática aos objetos em que
ele a aplicou. Jamais! Mas, não é cegando para as partes que veremos ou
direcionaremos melhor o todo.
Não posso dizer que Deus não amou Hitler, mas que Hitler
nunca manifestou o amor de Deus enquanto esteve no poder. Pode ter se
arrependido em seu leito de morte, isso não é comigo. O que quero dizer é que
as coisas, acontecimentos e pessoas não respondem somente ao preto e branco, todo
bom ou todo mau, a vida não é tão simples assim. Somente as crianças levam uma
bronca da mãe e dizem: “Eu te odeio! Você é a pior mãe do mundo!” Mas,
lembrem-se, em cinco minutos a criança está procurando seus braços...
Rejeitar um argumento não é rejeitar uma pessoa. Aceitar um
argumento não é aceitar uma pessoa. Rejeitar uma ação de uma pessoa, não é
rejeitar uma pessoa e tornar-se sua inimiga. A bíblia diz que “Leais são as
feridas feitas pelo que ama, porém os beijos de quem odeia são enganosos.” (Provérbios
27:6). Isso significa que muita gente que concorda com você e até lhe
elogia está lhe enganando e que há pessoas que lhe criticam que querem o seu
bem.
Aceitar uma ação de alguém também não é tornar-se sua amiga.
Numa sociedade equilibrada, todos precisam respeitar as divergências e ser
obrigado a concordar com tudo não é aceitação de divergências, é impor força de
persuasão, coerção. Jesus nunca aceitou nada que não fosse agradável a Deus e
Ele é a encarnação do amor de Deus.
Inteligência e seus limites
Eu convivo com cientistas de alto nível. Nível
internacional. Eles são capazes de analisar fórmulas que para mim são hieróglifos.
Mas, muitas dessas mesmas pessoas altamente capazes de diferenciar e analisar
sentenças matemáticas e física de alto nível não são capazes, muitas vezes de
perceber uma inconsistência lógica nos seus relacionamentos. As pessoas às vezes
possuem um determinado tipo de princípio de raciocínio numa área e não o estendem
para outra, perdendo muito com isso.
Se um objeto é lançado em uma trajetória com um
determinado impulso e nada se interpõe em seus caminho, ele continuará na mesma
direção até que o atrito o pare. Ou seja, que uma força contrária se oponha e o
pare ou mude sua direção, como um obstáculo. É parte da lógica da física. E na
área dos relacionamentos? Se uma pessoa foi seu amigo durante anos, sempre foi
fiel, andou com você... Agora, tornou-se seu inimigo porque discorda de você?
Paulo fez essa pergunta àqueles a quem discipulara, mas observe o contexto da
questão:
O que aconteceu com aquele espírito feliz que sentimos
juntos naquela ocasião? Porque eu sei que naqueles dias vocês, com toda a
alegria, teriam arrancado os próprios olhos e os teriam dado para substituir os
meus, se aquilo houvesse me ajudado.
E agora eu me tornei inimigo de vocês por lhes dizer a
verdade?
Esses falsos mestres que estão ansiosos em agradá-los não
estão fazendo isso para o bem de vocês. O que eles estão procurando fazer é
separá-los de mim, para que vocês prestem
mais atenção neles. (Gálatas 4:15-17 – Bíblia Viva)
Mas, quantas vezes um pesquisador que está acostumado a
primar pela consistência e permanência das forças volta-se contra seus amigos
de longa data, perdi as contas. E quantas pessoas convivem com outras por longo
tempo e possuem provas de sua amizade constante, mas voltam-se contra elas por
causa de um novo amigo, na maioria das vezes, manipulador e mau intencionado?
Porque perdemos tanto pessoas e coisas tão preciosas? Porque não paramos para
analisar os argumentos, as bases e as implicações daquilo que nos oferecem como
explicação dos fatos.
É preciso amor à verdade. Jesus é a verdade e a vida.
Ninguém vai ao Pai sem a verdade. A verdade, ainda que doa, cura; a mentira,
ainda que adoce a boca, mata, rouba e destrói. Porque se Jesus é a verdade e a
vida, Satanás é o Pai da mentira. Prefiro uma verdade dolorosa que traga vida
do que o doce veneno da mentira.
Os sistemas de argumentação falsos
Uma vez escutei uma propaganda política que dizia: Vote
em mim para deputada estadual. Sou negra, mulher e favelada. Há argumentos que
não justificam certas ações ou posturas. Desde quando o mapa de competências
para ser um bom representante na Câmara é o sofrimento inerente a pertencer a
uma minoria? O fato de ter sofrido não garante caráter, conhecimento,
capacidade de articulação política, compromisso com o bem-estar público... Mas,
muitas pessoas entenderam que essa era uma proposta de representação válida,
ainda que usasse um argumento meramente emocional e sem utilidade para resolver
a situação a que se referia. Se saber o que é sofrer garantisse o
desenvolvimento de boas leis, Lampião não teria se tornado o rei do cangaço (ou
fora da lei) depois de ter visto a sua família ser assassinada.
A bíblia diz que nós temos armas poderosas em Deus que “[...] não são físicas
[armas de carne e sangue], mas elas são poderosas diante de Deus, para subjugar
e destruir fortalezas, à medida que nós refutamos os argumentos, teorias e
raciocínio e todo o orgulho e altivez que se levante contra o verdadeiro conhecimento
de Deus, e guiando todo pensamento e propósito cativo à obediência de Cristo (o
Messias, o Ungido),” (2 Coríntios 10:4-5 – Bíblia Amplificada). Precisamos
estar atentos, porque há pessoas muito habilidosas com as palavras para o mal,
assim como devemos sê-lo para o bem:
Para o mal: “Raça de
víboras, como podeis falar coisas boas, sendo maus? Porque a boca fala do que está cheio o coração.” (Mateus 12:34).
Para o bem: “Procura
apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar,
que maneja bem a palavra da verdade.” (2 Timóteo 2:15).
“Não saia da vossa boca nenhuma palavra torpe,
e sim unicamente a que for boa para edificação, conforme a necessidade, e,
assim, transmita graça aos que ouvem.” (Efésios 4:29).
Observe a relação entre a afirmação do que deve ser feito
ou compreendido e as “provas” ou justificativas para assumir que essa é a
versão mais confiável. Não aceite tão facilmente argumentos meramente
emocionais porque não podemos ficar à mercê da interpretação alheia ou até
mesmo da nossa primeira impressão, que pode ser errada para o bem ou para o mal.
Veja o alerta de Paulo: “Não apagueis o Espírito. Não desprezeis as profecias;
julgai todas as coisas, retende o que é bom; abstende-vos de toda forma de mal.”
(1 Tessalonicenses 5:19-22).
Observe o equilíbrio:
A )Não despreze as profecias – porque Deus fala com você
sempre; Mas...
B) julgai todas as coisas – porque nem tudo o que se diz
é de Deus. Fique com a “parte” que serve, que corresponde à Palavra;
C) Rejeitem e não tenham contato com toda a forma de mal –
daquilo que escutar, só dê ouvidos ao que estiver em acordo com a Palavra, o
resto, é resto.
Talvez, a partir desse texto, que penso merecer ser lido
mais de uma vez, você possa repensar a forma como tem aderido a campanhas,
comentários, participado socialmente de discussões, etc.
Você pode orar assim:
Querido Deus, preciso de
discernimento para ouvir a tua Palavra e somente dar ouvidos a ela, aprendendo
a analisar as afirmações que me oferecem como verdade à luz da Tua Palavra eu
te peço em nome de Jesus.
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