Moisés foi um homem bem sucedido
nos empreendimentos que Deus lhe concedeu fazer, mas teve que vencer um grande
obstáculo. Observe o que ele conversou com Deus quando foi chamado:
Então, disse Moisés ao SENHOR: Ah! Senhor! Eu nunca fui
eloqüente, nem outrora, nem depois que falaste a teu servo; pois sou pesado de
boca e pesado de língua. Respondeu-lhe o SENHOR: Quem fez a boca do homem? Ou
quem faz o mudo, ou o surdo, ou o que vê, ou o cego? Não sou eu, o SENHOR? Vai,
pois, agora, e eu serei com a tua boca e te ensinarei o que hás de falar. (Êxodo
4:10-12)
Você pode chamar de
incredulidade, de covardia, de alguma outra coisa, mas havia algo que deixava
Moisés inseguro para realizar a sua missão. Ele tinha dificuldade de articular
as palavras (não era eloquente) assim como tinha dificuldade de escolhê-las de
forma mais adequada às situações (era pesado de boca e de língua). Você pode
pensar que isso era algo simples, mas não era. Observe que quando Deus chamou
Moisés ele era um ex-príncipe e general, que tornou-se um assassino fugitivo e que
havia se disfarçado como pastor durante quarenta anos no deserto. Toda a sua derrota
deu-se por causa da sua inabilidade para se comunicar e resolver uma situação
com argumentos. A bíblia relata o problema assim:
Naqueles dias, sendo Moisés já homem, saiu a seus irmãos e
viu os seus labores penosos; e viu que certo egípcio espancava um hebreu, um do
seu povo. Olhou de um e de outro lado, e, vendo que não havia ali ninguém,
matou o egípcio, e o escondeu na areia. Saiu no dia seguinte, e eis que dois
hebreus estavam brigando; e disse ao culpado: Por que espancas o teu próximo? O
qual respondeu: Quem te pôs por príncipe e juiz sobre nós? Pensas matar-me,
como mataste o egípcio? Temeu, pois, Moisés e disse: Com certeza o descobriram.
Informado desse caso, procurou Faraó matar a Moisés; porém Moisés fugiu da
presença de Faraó e se deteve na terra de Midiã; e assentou-se junto a um poço.
(Êxodo 2:11-15)
Observe que Moisés tinha uma motivação
justa, que era resolver o problema da aflição sobre o povo hebreu. Ele estava
indignado com a injustiça de faraó, ainda que fosse seu avô adotivo e lhe desse
tudo o que tinha. Mas, ele resolveu uma questão altamente complexa com o uso de
força direta sobre um ponto específico e não foi feliz. Ele só viu a ponta do
iceberg: uma briga entre um judeu e um egípcio), mas ele estava na realidade
lidando com uma sociedade opressora, escravagista, cruel, sustentada economicamente
no motor da exploração da escravidão de três milhões de judeus.
Como Moisés não lidou com raiz do
problema, os próprios hebreus não deram legitimidade a ele. Ele não tinha
autoridade nem estava em posição de condenar à morte os inimigos dos hebreus.
Imagine que falta de habilidade argumentativa essa: sua primeira discussão e
ele resolve com um assassinato. Não era para menos que ele se achava “pesado de
boca e de língua”. Moisés só conhecia o argumento de faraó e errou ao usá-lo contra
faraó e seu reino em uma questão particular. Ele tinha uma visão errada do
problema e da solução e, além disso, tinha poucos instrumentos intelectuais
para resolver a questão. Deus precisava aquietá-lo e ensiná-lo. Seu treinamento
levou 40 anos como pastor no deserto.
Imagine que para vencer essa
língua pesada foram necessários 40 anos de pastoreio. Deus trocou a truculência
pelo cuidado e o risco da guarda. No pastoreio, Moisés não tinha muito com quem
conversar. Enfrentou muitos momentos de solidão no deserto, vigiando e
guardando, alimentando e guiando as ovelhas, que substituíram os treinamentos
militares que recebera e as festas da corte de faraó. Moisés achou que suas
habilidades de trato social tinham atrofiado, mas, na realidade, tinham sido
reorientadas.
É preciso perder para ganhar
Na
corte de faraó, a verdade, o direito e o poder eram do rei. Não havia troca ou
negociação. Todos os que chegavam lá deviam se submeter ao “deus”. Era com esse
tipo de falar autoritário que Moisés estava habituado. “Obedecer ou morrer” era
o lema. Mas Moisés não seria um líder chamado pelos homens, seria um líder
chamado pelo Senhor dos céus e da terra. Ele iria servir, a Deus e aos homens
como líder. Moisés adquiriu, a duras penas, a capacidade de ouvir. Observe que
depois que ele tirou o povo do Egito, ele ouvia todo o povo, um a um: “no dia seguinte, assentou-se Moisés para julgar o povo; e o
povo estava em pé diante de Moisés desde a manhã até ao pôr-do-sol.” (Êxodo
18:13). Um rei
tirano dá ordens a respeito das necessidades dos outros a partir de seus
interesses, dita desde o que aconteceu até o que deve ser feito. Moisés tinha
os princípios de justiça de Deus no seu coração, mas agora, ele aprendera o
cuidado, então, ouvia todo o povo para orientá-los. Um pastor faz isso, ele
cuida de todo o rebanho e procura suprir a necessidade de cada ovelha.
Ovelhas não falam, então,
para ver a prosperidade do rebanho, um pastor é obrigado a observar o tempo
todo se elas estão bem. É observando e atentando se as ovelhas comem, bebem
adequadamente, se estão com frio ou calor, se estão em se aproximando de algum
perigo, se estão no caminho certo, se estão todas lá, que o rebanho cresce...
Esse é o maior argumento de todos, aquele que vem de dentro para fora. Moisés
já o tinha quando Deus o encontrou depois de 40 anos cuidando de ovelhas no
deserto, mas não o reconhecia. Sem o argumento do cuidado e da compaixão, ele
não teria conseguido tirar o povo do Egito. Moisés fora treinado a pensar que a
força dos exércitos de faraó e da coerção eram o princípio pelo qual ele argumentaria
com o povo, mas estava sendo chamado a seguir pelo princípio do amor, da
compaixão e da vontade de Deus, que convencem.
A linguagem do amor transcende as palavras.
Você não fala somente com aquilo que você diz, com o seu
cargo ou posição política ou financeira. Sua palavra leva o que você é e
principalmente o que você realmente é para Deus. Moisés tinha o coração pronto.
O seu senso de justiça sempre existente encontrou uma expressão exata no
cuidado de um pastor pelas ovelhas. Já diz I Coríntios 13.1: “¶ Ainda que eu
fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o bronze
que soa ou como o címbalo que retine.” (1 Coríntios 13:1).
Após 40 anos de deserto, foi
deposto o tirano e coroado o cuidador. Não importavam as palavras bem
articuladas de uma língua perfeitamente falada, mas o Senhor havia forjado um
coração que se expressava perfeitamente no escutar, no cuidar e não no impor.
Um negociador, um instrumento de convencimento e consenso, um ouvido antes de
um braço. A paciência que Moisés aprendeu no pastoreio foi crucial para o
sucesso do seu ministério. Um soldado rebelde é justiçado e lançado fora morto,
uma ovelha rebelde é corrigida com a vara e tratada ainda mais perto de seu
pastor.
O perigo dos extremos
Moisés desceu do pedestal de
achar-se capaz de resolver o problema dos outros para o pólo errado de
pensar-se incapaz. O Senhor mostrou quem Moisés podia ser em Deus e não em si
mesmo. Não aceitou que Moisés voltasse atrás ou que prosseguisse sem o Pai. Se
há algo que lhe desafia, não procure resolver na sua própria força e nem
desista, procure o caminho de Deus e vença com Ele.
Moisés sempre teve problemas
com o extremismo. Primeiro, ele não quis conversar e negociar no problema entre
judeu e egípcio. Imagine que ele era neto de faraó. Se tivesse utilizado sua
influência já seria bastante força, mas ele teve que ser violento e o preço a
pagara foi alto. Após 40 anos como pastor, aprendeu a escutar. Mas agora,
queria escutar três milhões de pessoas. Veja a repreensão de seu sogro vendo-o
escutar o povo do amanhecer ao anoitecer:
Vendo, pois, o sogro de Moisés tudo o que ele fazia ao
povo, disse: Que é isto que fazes ao povo? Por que te assentas só, e todo o povo
está em pé diante de ti, desde a manhã até ao pôr-do-sol? Respondeu Moisés a
seu sogro: É porque o povo me vem a mim para consultar a Deus; quando tem
alguma questão, vem a mim, para que eu julgue entre um e outro e lhes declare
os estatutos de Deus e as suas leis. O sogro de Moisés, porém, lhe disse: Não é
bom o que fazes. Sem dúvida, desfalecerás, tanto tu como este povo que está
contigo; pois isto é pesado demais para ti; tu só não o podes fazer. Ouve,
pois, as minhas palavras; eu te aconselharei, e Deus seja contigo; representa o
povo perante Deus, leva as suas causas a Deus, ensina-lhes os estatutos e as
leis e faze-lhes saber o caminho em que devem andar e a obra que devem fazer.
Procura dentre o povo homens capazes, tementes a Deus, homens de verdade, que
aborreçam a avareza; põe-nos sobre eles por chefes de mil, chefes de cem,
chefes de cinqüenta e chefes de dez; para que julguem este povo em todo tempo.
Toda causa grave trarão a ti, mas toda causa pequena eles mesmos julgarão; será
assim mais fácil para ti, e eles levarão a carga contigo. (Êxodo 18:14-22)
Agora,
Moisés exagera no ouvir. Ele era um homem dedicado em tudo o que fazia. Mas
precisava aprender outro princípio importante: todo homem é finito e falho. É
preciso dividir cargas, receber conselhos, delegar tarefas. Mesmo que as
pessoas ainda estejam só começando... Dê-lhes treinamento e tarefas
compatíveis, apóie outros a crescerem, não faça por ninguém aquilo que eles
puderem fazer por si mesmos.
É obra
do orgulho acharmos que temos a melhor solução sempre, que sabemos o que o outro
está pensando e precisa. Só Deus é tão poderoso assim. Não fomos chamados para
sermos como faraó. É preciso escutar sempre, tanto as pessoas quanto a Deus. Nós
só sabemos o que nossos sentidos percebem. E podemos nos enganar. Só Deus é
infalível e ilimitado. É preciso ouvir conselhos e vários aspectos da mesma
questão, como diz Provérbios:
Não havendo sábia direção, cai o
povo, mas na multidão de conselheiros há segurança. (Provérbios 11:14)
Onde não há conselho fracassam os
projetos, mas com os muitos conselheiros há bom êxito. (Provérbios 15:22)
Mais poder tem o sábio do que o
forte, e o homem de conhecimento, mais do que o robusto. Com medidas de
prudência farás a guerra; na multidão de conselheiros está a vitória. (Provérbios
24:5-6)
Lembro sempre que a Palavra é o nosso principal
conselheiro: “assentaram-se príncipes e falaram
contra mim, mas o teu servo considerou nos teus decretos. Com efeito, os teus
testemunhos são o meu prazer, são os meus conselheiros.” (Salmos 119:23-24). Portanto, o extremo da
imposição é um laço tão perigoso. E precisamos de dividir o fardo da escuta,
partindo da escuta da Palavra à escuta de quem teme a Deus baseando-se na
Palavra.
Aprendendo a evitar a violência ou a agressividade verbal
Se Moisés precisou aprender a não agredir, nós também precisamos
aprender a ter essa força nas respostas, pois “a resposta branda desvia o furor,
mas a palavra dura suscita a ira.” (Provérbios 15:1) e “a longanimidade persuade o príncipe, e a língua branda
esmaga ossos.” (Provérbios 25:15). Portanto,
se você é daqueles que não se importa com o resultado do que diz, não se
importa em como vai ser compreendida a sua mensagem, sempre fala e as pessoas
se calam e se retraem, não pense que está tendo nenhuma vantagem com isso. Você
está perdendo e muito. Perde oportunidades de amizades até oportunidades de
emprego e negócios. Observe que os bons negociadores sempre evitam choques
diretos, procuram algo que possam concordar, apóiam os argumentos do outro
sempre que possível, fazem o possível para que sua opinião não se contraponha,
mas seja um acréscimo positivo daquilo que o outro diz ou quer. Concordar é
sempre um ponto de partida para um acordo satisfatório. Discordar não precisa
ser o princípio de uma guerra. Poupe os outros dos seus gostos pessoais
contrários. Eles não precisam saber que você achou o cabelo novo horrível, que
não gostou da cor do carro ou que acha aquele time um bando de pernas de pau. Como
você não sabe quem está escutando, evite falar comentários desaprovadores ou críticos diante de várias pessoas, mesmo que a
conversa seja individual, pois estará atingindo todos os ouvintes, mesmo sem
perceber. Você poderá estar fechando portas e corações para você sem mesmo
perceber. Pessoas críticas são evitadas pelas outras. Poucas pessoas conseguem
resistir à presença dos críticos, a maioria procura evitá-las.
Desse modo, para Deus não é a
sua capacidade de articular palavras sonoramente e intelectualmente que vai
fazer a diferença. Nem mesmo as palavras agradáveis de serem ouvidas por si só,
mas o coração na posição de servo, enviado por Deus, fazendo apenas aquilo que
Deus lhe enviou a fazer. Se queremos levar a Palavra de Deus ou qualquer
mensagem, precisamos aprender a escutar a Deus e às pessoas. O Senhor nos
socorrerá nas nossas limitações e falhas, mostrando a sua onipotência,
onisciência e onipresença. Como diz Paulo: “Ora, os dons
são diversos, mas o Espírito é o mesmo. E também há diversidade nos serviços,
mas o Senhor é o mesmo. E há diversidade nas realizações, mas o mesmo Deus é
quem opera tudo em todos.” (1 Coríntios 12:4-6). Ele pôde transformar um general truculento, sem um mínimo de paciência
ou capacidade de argumentação em um líder capaz de lidar diuturnamente com três
milhões de rebeldes, dos quais só a geração seguinte conseguiu receber aquilo
que podiam ter recebido após duas semanas da saída do Egito 40 anos depois.
Podemos utilizar o atraso como medida da teimosia e rebeldia daquele povo com o
qual Moisés lidou perfeitamente, após vencer sua língua e boca pesadas.
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