sábado, 22 de setembro de 2012

Quebrando o galho




Há uma grande diferença entre discernir e julgar, condenar e exortar, mas acima de tudo, para compreender bem essa diferença, é preciso estar na postura correta. A estória a seguir  vai nos dar um ponto para prestarmos bastante atenção...

- Qual o problema de sua esposa?
- Surdez. Não ouve quase nada.
- Então o senhor vai fazer o seguinte: antes de trazê-la, faça um teste para facilitar o diagnóstico. Sem ela olhar, o senhor, a certa distância, fala em tom normal, até que perceba a que distância ela consegue ouvi-lo. E quando vier - diz o médico - dirá a que distância o senhor estava quando ela o ouviu. Está certo?
- Certo, combinado então.
À noite, quando a mulher preparava o jantar, o marido decidiu fazer o teste.
Mediu a distância que estava em relação à mulher. E pensou: "Estou a 15 metros..."
- Maria, o que temos para jantar? - não ouviu nada. Então aproximou-se ...
E repetiu o teste até que enfim, encosta-se às costas da mulher e volta a perguntar:
- Maria! O que temos para jantar?
- Frango, (irritada) ..... É a quarta vez que te respondo!

Por isso, a bíblia diz:

41  Por que vês tu o argueiro no olho de teu irmão, porém não reparas na trave que está no teu próprio? 42  Como poderás dizer a teu irmão: Deixa, irmão, que eu tire o argueiro do teu olho, não vendo tu mesmo a trave que está no teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho e, então, verás claramente para tirar o argueiro que está no olho de teu irmão. (Lucas 6:41-42).

Muitas vezes achamos que o problema ocorre com os outros, quando na realidade o problema é nosso... O argueiro é um pequeno ramo secundário de uma árvore, um graveto, que vem do ramo principal, esse, mais grosso e ligado ao tronco. A trave, no original, é referente ao ramo principal. O graveto é do outro, mas o galho é do exortador. A palavra no original para hipócrita significa um ator desempenhando um papel. É um culto religioso para os outros verem. Cobrando dos outros, parecemos ser mais sérios. Sempre escuto que a melhor defesa é o ataque. Esse tipo de atitude é comum. Olhando os erros dos outros, não só tiramos a nossa atenção dos nossos, mas também a dos outros.

A hipocrisia é solucionada pelo auto-exame e correção, seguida de compaixão em cuidar dos outros. Mostrando que há duas formas de incomodar-se com o pecado alheio: por nossa causa e por causa do outro. Quando o pecado do outro nos incomoda por nós mesmos, isso alimenta a nossa vaidade. Veja a ilustração de Jesus:

9 Propôs também esta parábola a alguns que confiavam em si mesmos, por se considerarem justos, e desprezavam os outros: 10  Dois homens subiram ao templo com o propósito de orar: um, fariseu, e o outro, publicano. 11  O fariseu, posto em pé, orava de si para si mesmo, desta forma: Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros, nem ainda como este publicano; (Lucas 18:9-11).

Os fariseus faziam grandes performances de religiosidade, usavam as franjas mais compridas (símbolo de santidade ao Senhor, obrigatório na vestimenta do judeu da antiga aliança) e usavam outros símbolos visíveis (Mateus 23:5), faziam alarde nas suas orações no meio das igrejas e pelas esquinas (Mates 6:5), etc. Tudo o que se faz para Deus, deve ser feito para que Ele saiba. Se os homens souberem é um efeito secundário, mas o nosso coração deve estar buscando o Senhor. A prática de procurar defeitos nos outros para encobrir os nossos e abominável diante de Deus. É preciso tirar a trave do nosso olho primeiro. E isso é uma tarefa árdua, mas vale à pena. Mas ela se tornará impossível se o nosso foco for manter a nossa imagem, negar os nossos erros e não abrir mão de voltar atrás nos erros e consertá-los. Se quisermos realmente ajudar alguém a mudar, primeiro, temos que mudar a nós mesmos. Assim, até sem palavras, mostraremos que há outro caminho. Senão, nossos atos ensurdecerão os ouvidos de todos à nossa volta.


Ajudando-se primeiro


O ator retira a maquiagem ao sair do palco. Assim, o hipócrita passa a ser uma pessoa comum. As pessoas comuns cometem os mesmos erros que todos. Por isso, elas não podem colocar-se no papel de juízes e juízas.  Se nos colocarmos nesse papel, não será mais do que uma fantasia, porque o verdadeiro e Justo juiz está no trono eterno e não se move de lá por nenhuma força.

Enquanto a acusação, a cobrança, mostra a hipocrisia e somente derruba o outro, o verdadeiro juiz, julgou o nosso caso, imputou pena de morte, desceu da tribuna e morreu no nosso lugar para pagá-la. Isso nos chama à sinceridade. Deus conhece todos os nossos defeitos e não nos abandona. A justiça de Deus se oferece sobre a nossa vida sob o manto do arrependimento. É por isso que, se tirarmos a trave dos nossos olhos, nós seremos encontrados culpados e necessitados de perdão por pecados maiores do que podemos ver nos outros. Mas, também veremos a misericórdia de um Deus que ofereceu-se por Pai e transformador de todos esses pecadores. E para tirar a trave dos nossos olhos, pagou o preço da vida de Seu Filho, tornando-nos todos iguais e necessitados de ajuda.

Somente quando nos arrependemos e recebemos perdão podemos ajudar os irmãos. Quando lançamos fora o ar de superioridade, de quem ajuda como se não houvesse recebido tudo de graça do Pai. Que preço pagamos pelo sangue de Cristo? Foi Deus quem fez o duro pagamento e Jesus o consumou, não para que nos tornássemos superiores aos outros, mas iguais. Iguais no pecado e na redenção em Cristo:

“Mas a Escritura encerrou tudo sob o pecado, para que, mediante a fé em Jesus Cristo, fosse a promessa concedida aos que crêem.” (Gálatas 3:22)

“23  pois todos pecaram e carecem da glória de Deus, 24  sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, 25  a quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação, mediante a fé, para manifestar a sua justiça,” (Romanos 3:23-25).

Lembre-se: não há imunidade


No reino dos céus não há imunidade parlamentar. Nenhum de nós, nem o próprio Cristo está ou esteve acima da lei. Daí, cabe o alerta de Paulo:

12  Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia. 13  Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar. (1 Coríntios 10:13).

“Irmãos, se alguém for surpreendido nalguma falta, vós, que sois espirituais, corrigi-o com espírito de brandura; e guarda-te para que não sejas também tentado.” (Gálatas 6:1)


O graveto é do irmão, mas o ramo é do hipócrita. O conselho em estilo acusação aponta o hipócrita. Mas o arrependido coloca-se no lugar daquele que peca  como tendo sofrido consequência de seus próprios pecados e procura ajudá-lo, amando-o como foi ajudado um dia. Inclusive, ninguém conhece nem os seus pecados, já dizia Davi: " Quem há que possa discernir as próprias faltas? Absolve-me das que me são ocultas. " (Salmo 19:12).  Nós podemos estar errados e nem percebermos. Muitas pessoas sabem que estão erradas, outras são sinceras, mas todas erram. É óbvio que moralmente é pior quem erra conscientemente, mas diante de Deus é tudo pecado e só a  misericórdia pode nos ajudar. Então, não podemos privar a ninguém dela.


As consequências da falsa superioridade


Quando uma pessoa no contexto do nosso texto inicial diz: “Deixa que eu tire o argueiro do teu olho...” É como se fosse fazer um grande favor ao outro. Como uma pessoa de alto escalão que se curva para conceder favor a um súdito. Quem aconselha, sente-se superior, mas não vê a trave no seu próprio olho. A hipocrisia, faz cobrar do outro aquilo que você não faz ou que nem você faz. Os fariseus eram hipócritas, atavam fardos às costas dos homens, fingiam orações, mas devoravam as viúvas, eram avarentos, tinham inveja...

Jesus os descrevia assim:

2  Na cadeira de [autoridade de] Moisés, se assentaram os escribas e os fariseus. 3  observem e pratiquem, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém não façam o que eles fazem; pois eles pregam e não praticam. 4  Eles atam fardos pesados [e difíceis de carregar] e os põem sobre os ombros dos homens; mas, eles mesmos nem com o dedo querem movê-los.
5  Praticam, porém, todas as suas obras com o fim de serem vistos dos homens; pois alargam os seus filactérios (pequenas caixas que guardavam passagens das escrituras, que eram colocadas como parte da vestimenta durante a oração no braço esquerdo e na testa) e alongam as suas franjas [vestidas por todos os homens israelitas, de acordo com os mandamentos]. 6  Amam e têm prazer no lugar de honra nos banquetes e os melhores lugares nas sinagogas, 7  as saudações com honra nas feiras livres e haver pessoas os chamando de mestres.
8  Vós, porém, não sereis chamados mestres (professores), porque um só é vosso Mestre, e vós todos sois irmãos. 9  A ninguém sobre a terra chameis vosso pai terreno; porque só um é vosso Pai, aquele que está nos céus. 10  Nem sereis chamados guias (líderes), porque um só é vosso Guia, o Cristo. 11  Mas o maior dentre vós será vosso servo. (Mateus 23:2-11 – Bíblia Amplificada)

Então, Jesus cita características da hipocrisia religiosa: Incoerência (v.3), santidade aparente com atividades e doutrinas escravagistas (v. 4), vaidade e necessidade de chamar atenção, honra, títulos e reconhecimento para si (v.5-6), retirando a glória de Deus e a dando a si mesmo.

Colocando equilíbrio

Observe que uma interpretação ao pé da letra e apartada do todo da escritura poderia dizer que não podemos chamar ninguém de mestre. Mas, o texto não se refere ao fato de uma pessoa que ensina, mas nós não podemos apontar alguém como fonte inquestionável de conhecimento.

7  as saudações nas praças e o serem chamados mestres pelos homens. 8  Vós, porém, não sereis chamados mestres [Rabi, meu Mestre], porque um só é vosso Mestre [Guia], e vós todos sois irmãos. (Mateus 23:7-8).

O primeiro é um título humano, um cargo, o segundo, descreve alguém que tem autoridade de dizer o que  é certo e errado. Traduzindo, não dê a nenhum homem carnal o poder de guiar a sua vida. E nem queira dominar a vida dos outros, tornando-se “rabi”, como se você fosse a fonte de conhecimento supremo. O máximo que podemos fazer é levar as pessoas à fonte, que é Jesus e Deus. Há pessoas e famílias que são treinados para serem os que sabem tudo. Isso passa pela cultura da família, e, portanto, pode estar no modo automático, mas pode ser corrigido.

Deus estabeleceu os mestres, que levam as pessoas ao conhecimento de Deus como ministérios: “e ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres,” (Efésios 4:11). Ninguém pode ser o Guia Eterno de ninguém, mas todos os que aprenderem de Deus podem ensinar o que vivem e com o que vivem. Alguns até recebem a extrema responsabilidade da coerência de terem um ministério voltado ao ensino.

A mesma lógica segue para Pai e pai. Ora, Mateus descreve com a mesma palavra grega usada em Mateus 23, o pai de  Tiago e João. Se fosse errado chamar uma pessoa de pai, o próprio evangelista não teria registrado isso em Mateus 4:21. Como há outra diferença entre a palavra guia que é usada para os homens, a primeira palavra é de um líder, que mostra o caminho, e a relacionada ao nosso Guia eterno tem o sentido de Guia Eterno. São a mesma palavra no original, mas ganham, na frase, sentido diferentes.

Não é a palavra, é o sentido e a direção que ela ganha no contexto. Cuidado com a literalidade e a perda do todo da mensagem, pois isso nos leva à letra, que mata: “[Jesus] o qual nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica.” (2 Coríntios 3:6). 


Você pode orar assim:

Querido Deus, perdoa-me por todas as vezes que olhei para as pessoas procurando erros ao invés de olhá-las com os olhos da tua graça. Ajuda-me a estar atento que, todas as vezes que eu vir alguém pecando preciso examinar minha consciência e a minha vida para poder aproximar-me e falar algo. E quando eu falar, que seja por ele ou ela, que seja para ajudar e ver bem, não para me mostrar superior, nem para esconder minhas falhas, nem para vingar-me porque o que ele faz me incomoda.


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