terça-feira, 10 de abril de 2012

Deus, a mulher e o feminino




Um texto que procure trazer a compreensão do que é feminino tem o gosto de uma vivisseção em si mesmo (aquele costume horrível de abrir os animais vivos para estudá-los). Não conseguirei nada de mais objetivo do que aquilo que é possível a alguém que é mulher e que procura desmistificar o feminino cultural dolorido e doloroso para encontrar uma identidade cristã feminina aos olhos do Pai.

Uma vez o meu professor de Lógica Formal disse algo realmente precioso. Ele disse buscar uma humildade científica. Aquela que se dobra àquilo que a ciência pode provar. Isso o havia levado a derrubar o racismo, porque ele não tem base científica, uma vez que todos os seres humanos sem a pele são iguais biologicamente em essência a não ser uma aptidão muscular mais desenvolvida em determinadas raças do que em outras, mas nada que realmente posa ser aplicado ao intelecto, à vontade ou às emoções.

Talvez eu esteja aqui buscando uma humildade cristã, aquela que reserva as suas conclusões sob a autoridade da Palavra de Cristo. Sabendo que há muito da verdade que os meus próprios limites me impedem de enxergar, mas outras tantas verdades que estão extremamente claras na Palavra e que podem ser levantadas sem o perigo tão grande de viés ou tendenciosidade. Ao mesmo tempo, você que lê, precisa procurar a nobreza dos habitantes da Beréia, procurar na Palavra para ver se de fato é assim (Atos 17:11).  

Porque tantas reticências? Porque nós vamos tocar em dores e poderes. Essas são duas forças sociais e individuais poderosas que se infiltram na nossa pele e dizem como lemos os nossos espelhos. Se há algumas coisas que são fáceis de ser, na lista não consta o fato de ser mulher. Aquilo que é nosso forte é também nossa fraqueza. O que nos define também nos confunde. Somos absolutamente multitarefa, mas o corpo nos leva a ciclos de humor e disposição diferentes que nem nós entendemos a não ser depois de muito tempo de convivência conosco mesmo. O eterno mistério que os homens...


...tentam desvendar.

Uma diferença biológica fundamental

As mulheres possuem uma área neurológica mais desenvolvida, o sistema límbico do córtex cerebral. É a área das emoções. O valor simbólico das coisas é muito mais percebido pelas mulheres. Isso não é bom e nem mau até que se faça uso desse potencial. Eu relaciono isso com o fato de ter sido criada da costela, da proteção do coração (Gênesis 2:2). Uma mulher no plano de Deus pode ser conforto: “A mulher sábia edifica a sua casa,[...]” (Provérbios 14:1a) E fora dos planos de Deus pode ser destruição: “[...] mas a [mulher] insensata, com as próprias mãos, a derriba.” (Provérbios 14:1b).

Perceber uma área melhor é tanto uma vantagem quanto uma desvantagem. A ofensa é mais fácil quanto mais se percebe. Quando se olha só a estrutura se vê o resultado. Quando se observam os valores, se focam as intenções. A mulher valoriza o motivo pelo qual se faz determinadas coisas. Isso é diferente de observar o resultado somente. Geralmente, os homens são treinados para observar e procurar os resultados.

Vou te dar um exemplo... Você arrumou o quarto, colocou lençóis novos, deixou o ambiente perfumado e saiu para arrumar o jantar. Seu marido chegou, sentou na cama e percebeu aquele rangido que você pediu para arrumar faz tempo. Pensou que tinha tempo e arrancou fora os lençóis, jogando num canto; tirou a camisa, jogou na cadeira; tirou o colchão e pôs-se a martelar a bendita cama rangedora, até que você foi ver o que estava acontecendo. Entrou e encontrou o quarto que você acabou de preparar de pernas para o ar e seus lençóis novos largados sem nenhum cuidado no máximo numa cadeira (porque nessas alturas eles podem ter ido parar  no chão). Seu marido, todo sorridente, vai dizer: “Está vendo? Agora ela não range mais!” – todo herói, querendo o seu reconhecimento.

Você tem duas opções: ficar com a melhor parte, a disposição que finalmente ele teve de fazer algo que você queria e esperar a empreitada acabar para reorganizar o quarto. Porque só assim você poderá mostrar-lhe diretamente os lençóis novos, que ele não vai perceber mesmo; ou ficar aborrecida e deixá-lo completamente perdido. Porque ele não vai entender de maneira nenhuma como é que ele faz algo que você pediu, com a maior boa vontade e você fica aborrecida.

A dor e o prazer da convivência

Distinguir o que essa diferença de foco homem e mulher tem de cultural e de biológica é praticamente impossível. Apenas podemos dizer que certamente a mulher tem mais facilidade de desenvolver essa leitura simbólica. Mas nós vivemos numa sociedade em que os homens são treinados a perceber as próprias necessidades e não as das mulheres e nem mesmo dos filhos. É óbvio que essas habilidades podem ser desenvolvidas, mas não o serão sem motivação e atitude adequadas para romper os padrões existentes.

Creio que faria um bem enorme aos relacionamentos se os homens fossem treinados a perceber os valores contidos naquilo que recebem das mulheres e as mulheres desenvolvessem a indulgência com as limitações masculinas com relação à percepção das intenções e valores atrás dos gestos. Afinal, bem que Paulo disse que iria haver um sofrimento com as imperfeições quando nos ajuntássemos: “Mas, se te casares, com isto não pecas; e também, se a virgem se casar, por isso não peca. Ainda assim, tais pessoas sofrerão angústia na carne, e eu quisera poupar-vos.” (1 Coríntios 7:8)

Diferença não quer dizer inferioridade ou superioridade

Nós temos realmente muita dificuldade em lidar com as diferenças. Há entre os seres humanos e entre os gêneros uma necessidade de exercer poder que é doentia e que pode extrapolar até às raias da violência. Historicamente, a mulher tem sido vítima dessa forma de pensá-la como pertence, objeto, coisa. 

Na civilização grega, as mulheres eram meros pertences, listados no rol de bens do esposo. Isso também foi vivido no Brasil colônia. As mulheres só conseguiram direito de voto em 1932, no Brasil. Faz 80 anos, duas gerações. No entanto, ainda desde a Grécia antiga, elas conseguiam burlar os limites da dominação e se entremetiam na cultura e na ciência, mostrando sua potencialidade intelectual diferente em conteúdo e igual em quantidade, meramente oprimida por ocasião histórica e social.

Jesus e as mulheres

Jesus desafiou vários itens da cultura da sociedade em que nasceu com relação a esse aspecto. As mulheres continuavam listadas no rol de bens dos homens. Sequer eram contadas nos ajuntamentos (Mateus 14:21). Os homens eram proibidos de dirigir-se a uma mulher diretamente, a menos que fossem seus maridos. 

Jesus falou diretamente com uma mulher que tinha tudo para ser desprezada pela sociedade da época. Em João 4, todo o capítulo é sobre como o Senhor se aproximou de uma mulher desprezada. Era desprezada por ser samaritana, porque havia um ódio xenofóbico e não apenas um bairrismo entre Judá e Samaria. Os dois povos mutuamente se odiavam porque eles já tinham profanado o santuário um do outro. Também era desprezada por ser uma mulher que já havia tido cinco maridos e estava no sexto relacionamento, este último não oficial... Não era de classe rica, senão não viria tirar ela mesma água no poço ao meio dia, debaixo de um sol de 45 graus, mandaria uma serva.

Jesus poderia desprezá-la por qualquer desses motivos e poupar-se de críticas. Até seus discípulos se espantaram de que estivesse falando a uma mulher (João 4:27).  Mas, ao falar com ela, Jesus transformou sua vida. E aquela mulher passou a ser escutada por todos, inclusive pelos homens. Por isso Paulo diz:

27  porque todos quantos fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes. 28  Dessarte, não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus. 29  E, se sois de Cristo, também sois descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa. (Gálatas 3:27-29)

A primeira evangelista

A mulher de Samaria (João 4) se tornou a primeira evangelista nomeada diretamente por Jesus. Em Cristo, ela tornou-se apenas aquilo que ela cria que iria se tornar, uma herdeira da promessa pela qual Abraão esperara.

Além disso, assim foi anunciado em Pentecostes:

16  Mas o que ocorre é o que foi dito por intermédio do profeta Joel: 17  E acontecerá nos últimos dias, diz o Senhor, que derramarei do meu Espírito sobre toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos jovens terão visões, e sonharão vossos velhos; 18  até sobre os meus servos e sobre as minhas servas derramarei do meu Espírito naqueles dias, e profetizarão. (Atos 2:16-18).

Está aí o registro de que Deus é Espírito. No nível do espírito o que importa é a vontade de agradar ao Pai e essa independe de sexo. “Deus é espírito; e importa que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade.” (João 4:24). As mulheres têm sido silenciadas por muitos motivos, mas não por motivos espirituais.

As primeiras diaconisas

Três mulheres foram prestar serviço físico de embalsamamento do corpo de Jesus. É esse o sentido da palavra diákonos no grego, servos. Foram as mesmas três mulheres que anunciaram a ressurreição de Jesus aos apóstolos (Lucas 24:1-9). Maria Madalena foi a primeira a ver Jesus ressurreto e dela haviam saído sete demônios (Mateus 16:9). Na realidade, elas estavam lá para cuidar do enterro de Jesus e lamentar sua falta. Se um homem estivesse lá teria recebido o aviso primeiro. Não foi o sexo, mas o coração, a disposição de servir quem definiu a intimidade com Deus, pois “porque o SENHOR abomina o perverso, mas aos retos trata com intimidade.”(Provérbios 3:32). Mas o fato de Jesus não ter feito diferença e honrado a sua fé dedicada, confirma que Deus não dá privilégios arbitrários fazendo distinção por sexo no que diz respeito às suas bênçãos e autorização para serviços (Romanos 2:11).

O silêncio das mulheres na igreja

Um texto mal entendido pode ser desastroso. Principalmente se for dado como Palavra de Deus sem sê-la. Quero lembrar que quando o Espírito Santo foi derramado sobre a igreja em Pentecostes estavam reunidos ali cento e vinte pessoas, entre essas pessoas, mulheres:

13  Quando ali entraram, subiram para o cenáculo onde se reuniam Pedro, João, Tiago, André, Filipe, Tomé, Bartolomeu, Mateus, Tiago, filho de Alfeu, Simão, o Zelote, e Judas, filho de Tiago. 14  Todos estes perseveravam unânimes em oração, com as mulheres, com Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele. 15  Naqueles dias, levantou-se Pedro no meio dos irmãos (ora, compunha-se a assembléia de umas cento e vinte pessoas) e disse: (Atos 1:13-15)

Depois, quando o Dia de Pentecostes chega acontece que

1 Ao cumprir-se o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar; 2  de repente, veio do céu um som, como de um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam assentados. 3  E apareceram, distribuídas entre eles, línguas, como de fogo, e pousou uma sobre cada um deles. 4  Todos ficaram cheios do Espírito Santo e passaram a falar em outras línguas, segundo o Espírito lhes concedia que falassem. (Atos 2:1-4)

Estavam todos reunidos no mesmo lugar e todos ficaram cheios do Espírito Santo. "Todos" inclui as mulheres. Estavam todos falando e você pode perceber pelo restante do texto que todos os que os escutavam os entendiam de forma sobrenatural. Aí estão as pregadoras, pregadores e profetas e profetisas do início da igreja. Igreja significa “reunião dos escolhidos”. Os escolhidos de Deus estavam reunidos e no que tinha relação com o Espírito, todos falavam. Não havia silêncio nem das mulheres e nem dos homens.

A cultura da ignorância

A cultura de vários países tem afligido a mulher e á sua existência de forma brutal. Nas culturas orientais antigas ainda mais. Se hoje o islamismo impõe uma burca física sobre a mulher (vestimenta que só possui abertura para os olhos e para as mãos das mulheres), muitas culturas impõe uma burca intelectual e volitiva que tem resultados tão ou mais violentos.

Na Judéia e cultura judaica dos tempos de Jesus a mulher não devia ser ensinada. Ela não tinha educação na sinagoga e não aprendia a Palavra a não ser que seu pai ou marido a ensinasse em casa. Ela não podia sair à rua desacompanhada, se uma visita entrasse em casa ela deveria se retirar e só entrar para servir à mesa. Não podia chegar-se à janela de casa para expor-se aos olhos dos passantes. Jamais conversar com um homem. A única oportunidade que tinham era de sentar-se na parte de trás das sinagogas, apartadas dos homens e distante do culto, junto com as outras mulheres.

Você não precisa de muita imaginação para entender o que essas mulheres faziam durante o culto, não é? Colocavam toda a conversa em dia. Além do que, enquanto que à medida que os não judeus foram se convertendo, os costumes dos outros povos foram se colocando nos cultos e precisava haver correção. As mulheres gregas eram oprimidas em grande parte da Grécia, mas outra parte era de sociedades matriarcais. Elas eram líderes sobre seus esposos e elas os oprimiam.

E aí, você tem correções como “conservem-se as mulheres caladas nas igrejas, porque não lhes é permitido falar; mas estejam submissas como também a lei o determina. Se, porém, querem aprender alguma coisa, interroguem, em casa, a seu próprio marido; porque para a mulher é vergonhoso falar na igreja.” (1 Coríntios 14:34-35).  Ou “E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio.” (1 Timóteo 2:12).

Se Jesus não quisesse que as mulheres levassem a Palavra, não teriam usado a mulher samaritana para alcançar Samaria, nem teria anunciado a sua ressurreição às três mulheres, nem teria usado Priscila (Atos 18:18, 26; Romanos 16:3; 1 Coríntios 16:19), nem João teria confirmado em carta específica o trabalho de uma dirigente de igrejas em sua segunda carta.

Isso não é novidade

Não entendo o que há de novo em mulheres levantarem-se na sua fraqueza para servir a Deus. Débora era a líder espiritual e política de Israel mais de mil anos antes de Cristo (Juízes 5). Miriam profetizava desde que o povo atravessou o Mar Vermelho (Êxodo 15:20-21) quase duzentos anos antes de Débora. Wesley, fundador do movimento metodista (1703-1791) retomou a autorização do ministério feminino quando renovou a fé na Inglaterra e o resultado foi um país abençoado. A fé nos faz servir ao Senhor dentro das nossas diferentes fraquezas. Em fé podemos ir além dos nossos limites se nossos corações estiverem livres para nos ver nas possibilidades de Cristo, pela sua Palavra.



O que eu acho realmente problemático é que toda vez que procuramos corrigir uma injustiça tendemos a virar o jogo. Os que se viam oprimidos procuram tornar-se opressores, porém a vingança vem de uma dor no coração. O espaço e o respeito não vêm dos homens diretamente. Eles vêm de Deus. Eu já fui desacreditada e desrespeitada por ser mulher e precisei perdoar para não ser atingida por isso na minha relação com Deus. Qual mulher não foi bem tratada ou maltratada por ser mulher? As pessoas fazem diferenças, Deus não. As pessoas vêem o seu corpo, Deus o seu espírito.

Na realidade, quem é servo faz sua vida para Deus e não para ser reconhecido. Se alguém não respeita o seu chamado e a unção que o Senhor lhe deu, vai prestar contas ao Senhor. Eu aprendi que não preciso provar nada para Deus porque Ele já sabe e não posso provar nada aos homens e mulheres quando eles não querem saber. Então, contratei um Advogado, Um assessor jurídico eterno, à direita do Pai e Ele toma essas causas para si (1 João 2:1-2). Diferenças sim, injustiça não. Mas o amor é o único que pode dar uma solução realmente curativa para todos os envolvidos nessas questões. O amor traz o perdão e a paciência.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente a mensagem ou faça sua pergunta.

Web Analytics